terça-feira, 3 de julho de 2012

SERÁ MOMENTO DE MUDANÇA? - Chefe de espionagem interna alemã...

JORNAL PÚBLICO de 03.07.2012

Alemanha
Chefe de espionagem interna alemã sai após destruição de ficheiros sobre neonazis
Por Maria João Guimarães
Em causa estão documentos sobre membros de célula que matou dez pessoas durante quase uma década
O responsável pelos serviços secretos internos da Alemanha, Heinz Fromm, demitiu-se na sequência de um enorme escândalo que estourou na semana passada, quando se soube que documentos ligados a uma célula de neonazis que durante uma década mataram dez pessoas, na maioria imigrantes turcos, tinham sido destruídos.

Aparentemente, a destruição foi levada a cabo por um agente sem ter sido ordenada pela sua chefia. Os documentos diziam respeito a uma operação de recrutamento de informadores de um grupo de extrema-direita do estado federado da Turíngia, onde a célula de neonazis responsabilizados pelos assassínios tinha vivido antes de entrar na clandestinidade.

Aliás, os nomes de dois dos membros da chamada célula de Zickaw - Uwe Bönhardt e Uwe Mundlos - estavam entre os nomes de uma lista de 73 "homens em idade militar" elaborada pelo serviço de contra-informação militar alemão, diz a revista Der Spiegel - lista cujo objectivo não era claro. De resto, os documentos incluiriam os nomes de 35 candidatos e dos oito recrutados como informadores.

Os ficheiros foram destruídos a 12 de Novembro do ano passado - pouco depois de um episódio quase cinematográfico: uma tentativa de assalto a um banco que correu mal levou a uma perseguição policial e acabou com a morte (assassínio-suicídio ou duplo suicídio) dos dois envolvidos. Estes tentaram ainda incendiar o local onde viviam para apagar as pistas que os ligavam a dez mortes ocorridas anos antes (entre 2000 e 2009), mas não conseguiram. Só então foi desvendado o mistério dos dez assassínios.

A divulgação da destruição dos ficheiros pouco depois desta descoberta foi recebida com incredulidade de políticos da esquerda à direita. "Estes incidentes tornam difícil uma refutação convincente das teorias da conspiração", afirmou Sebastian Edathy, do Partido Social Democrata (oposição), dirigente da comissão parlamentar que investiga as falhas que permitiram ao grupo manter-se na clandestinidade e matar tantas pessoas sem as autoridades nunca seguirem a pista da extrema-direita, preferindo sempre a de máfias ou ajustes de contas.

A destruição, afirmou pelo seu lado Clemens Binninger, da União Democrata Cristã (CDU, partido da chanceler, Angela Merkel), dá azo a "todo o tipo de teorias", por exemplo, que nos serviços secretos há quem tenha ligações à extrema-direita ou simpatia pelos neonazis.

Sabe-se que pelo menos nos seus esforços de infiltração os agentes terão, por vezes, ido além do seu papel. Um processo para a ilegalização do Partido Nacional Democrata (NPD), em 2003, falhou aliás quando se percebeu que algumas das tiradas mais provocatórias e anticonstitucionais tinham sido proferidas por espiões infiltrados no partido.

O caso da morte dos nove estrangeiros ou alemães com ascendência estrangeira (turca na maioria dos casos, grega no outro) e de uma agente da polícia provocou uma enorme onda de indignação na Alemanha.

Como foi possível à chamada célula de Zickaw operar impune durante uma década? Os seus três membros - para além dos dois homens que morreram na sequência da perseguição, havia uma mulher, que se entregou depois às autoridades - tinham já sido referenciados como elementos perigosos durante a sua actividade na Turíngia. Como é que as autoridades lhes perderam o rasto? Há muitas perguntas sem resposta e a destruição dos ficheiros veio adensar ainda mais o mistério.

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